sábado, 21 de maio de 2011

Livro: Flores de Condão

Terminei de escrever meu primeiro livro mas, ainda sem publicação. Para situá-los no contexto, posto esse texto.
                       Ensaio lúgubre
(Muito prazer, eu sou... assim)

No inicio era a oralidade... As histórias eram contadas. A minha, oferecida! Sempre que as apresentações iam além do muito prazer, eu me apresentava, em capítulos, aos canteiros - por falta de tempo. Era assim, muito intimamente, que as pessoas passavam a me conhecer: através da minha história! Quem me ouvia, perguntava: “por que você não escreve um livro?” Mesmo depois de muito tempo, quando me encontravam novamente, faziam a mesma pergunta. Até que eu, que sempre almejei ser escritora, decidi que ia SER. Por algum tempo exercitei o ofício, escrevi e joguei fora. Às vezes resolvia que ia dar um rumo certo para a minha escrita, mas quando ficava insatisfeita, dizia para mim mesma que não era capaz e pegava tudo, rasgava e jogava no lixo. Depois de muito tempo, entendi que o que eu jogava eram apenas os papéis. Minha história continuava dentro de mim e se expandia cada vez mais. Conclusão (óbvia!): minha história sou eu. E eu não posso me livrar de mim mesma. Para chegar aonde eu queria (me convencer que era capaz), minha mente passou a escrever por conta própria. Escrever, ler, criticar, descobrir, inventar, refazer e mutilar. Involuntariamente, descontroladamente, repetidamente. Se antes eu tinha na cabeça uma caverna cheia de desenhos rupestres, agora ela estava inteira, ocupada por páginas e páginas impressas de mim mesma. Quando resolvi parar para esticar a memória, reconheci os sintomas da loucura, mas era tarde. Já havia caído no vício. E novamente, tudo recomeçou. Até que não consegui mais parar por nada. Meus pensamentos, multiplicados em milhões de mega pixels, me torturaram até se tornarem maiores do que eu. Foi um transtorno descobrir que eu não mandava mais em mim. Depois de muito relutar em tornar minha história concreta, aconteceu o que eu menos esperava: meu cérebro transbordou. Corpo e mente não se davam mais; perdi o controle e entrei em colapso. Meu sistema não comportava mais tantos traços e rabiscos; tantas palavras e idéias; tantos tropeços e correntezas; faltava espaço. Foi quando recebi um alerta de vírus, com efeitos colaterais: mal-estar súbito com ânsia sem vômito. Parecia que eu havia engolido um pássaro com asas e toda vez que ele batia as asas para voar, eu impedia engolindo-o novamente. Minha mente dizia: voe! Meu corpo dizia: não posso! Então, fiz o que acreditei ser possível: ignorei os limites e descartei as necessidades. Mas, meu orgulho próprio sempre fora exacerbado e o desejo de me salvar foi mais forte que a vontade de me abandonar. Quando cheguei ao ponto máximo das minhas forças, resolvi me passar a limpo e me programar de novo. Munida de uma intuição lógica (e patológica), juntei alma e coração para me derramar até fluir todo o meu SER. Eu sabia que se enfiasse o dedo na garganta, ia vomitar até morrer de fraqueza. Então, sucumbi o corpo à mente; ele sofre, mas ela não sente. E, ao invés de vomitar, eu deixei o pássaro voar...

Nesta história um escritor é ameaçado de morte e tem que escrever um livro. Forçado, ele aceita, mas se exclui de qualquer responsabilidade. Da mesma forma que ele, quem o ameaça, também está com seus dias contados. Ambos sonham com a fama, mas um ainda nem começou a carreira e o outro já chegou ao fim. Por falta de coragem, o escritor cuja identidade é quase desconhecida, permanece no anonimato e em seu lugar, uma personagem se expõe e encara qualquer desafio. Acontece que os problemas são reais, como personagem não é gente, ela não pode assumir nada. Eles não se dão bem, mas entram num acordo para realizar a tarefa juntos, como última tentativa sobrevivência.

Em respeito aos leitores, por quem nutro considerável admiração, eu não queria ser mais uma pessoa que escreveu um livro. Se literatura é arte (e sabemos que é), penso que ninguém tem o direito de escrever por escrever. Então, o que fiz foi relatar o que aconteceria comigo, caso eu quisesse ser escritora. Isso pode lhes parecer estranho, mas entenderão quando estiverem lendo o que escrevi. Quanto ao título, não foi escolhido ao acaso, ocorreram-me vários outros, porém nenhum foi suficiente para definir com fidelidade meus desejos e minhas fantasias. Cada episódio é um canteiro de sementes encubadas, esperando o tempo certo para desabrochar em flores. Potencialmente, cada flor contém uma realidade fantástica ou uma fantasia real, você decide. Mas, não se esqueçam que cada história é quase uma mágica na escala de sobrevivência. Contudo, não há nem bandido, nem herói, nem príncipe, nem rei, nem bruxa, nem fada. Junto com o título, o contexto é apresentado numa linguagem mista de identidades variadas que entremeiam os séculos dezenove e vinte. O escritor (personagem) e a narradora (personagem) são antagônicos; lutam juntos, mas permanecem separados. Além deles, existem outras personagens de almas nuas, viciadas e dependentes, cada uma a seu modo, mas com características bem humanas. Elas se expõem, desafiam, mexem, incomodam, inibem, intimidam, absolvem e concebem com mentiras, invenções e enganação de acordo com a verdade que conhecem; na esperança de serem vistas por quem quiser olhar. Todas vivem em controvérsia num mundo irônico e equivocado; enredadas pelo destino, se sobrepõem ao passado e ao presente para abrir possibilidades (imaginárias) no futuro. Suas atitudes e conceitos diferem na forma de encarar os movimentos circunstânciais do regionalismo cultural, da ciência especulativa, da fé cega e do sentimentalismo banal. Gostaria de dizer que tenho personagens geniais, mas não posso. Elas são sobreviventes, decorrentes de uma confusão concreta entre conhecimento e ignorância. Elas se atropelam nas palavras e nas idéias, mas se encontram nos ensaios sem pronúncia, no abismo da existência e no mistério da invenção. No entanto, devo dizer o que a mim compete: tenho personagens excepcionais, com sensibilidade suficiente para fazer qualquer um compreender que a vida é maravilhosa, cheia de efeitos especiais! Portanto, brindem à sorte! A sua! A nossa!

Com o pretensioso objetivo de cutucar cérebros e desfolhar pensamentos, o livro apresenta lacunas, permitindo que os leitores se infiltrem na história - seja através do drama, tragédia, comédia, ação ou terror - para preenchê-las, de forma que possam se constituir como leitores - criadores. Enfim, com doses moderadas de felicidade, tristeza, sarcasmo, deboche e atrevimento, eu me libero de qualquer compromisso, a partir de agora. Para vocês: Flores de Condão! Malva Maria.